domingo, 5 de setembro de 2010

Teresa Kayuva e a saudade do SUS


Essa paciente, com esse sorriso bonito, se chama Teresa Kayuva. Ela é diabética e veio ao hospital para tratar de uma infecção na perna. Encontro com ela quase todos os dias no hospital, quando ela vem para trocar os curativos, o que para mim faz uma mistura de sentimentos. Fico alegre em ver seu sorriso bonito e resignado, diante do quadro que se arrasta já há muito tempo, reconhecendo no seu sorriso também o sentimento de gratidão por ser bem tratada lá. Por outro lado, ela mora numa vila distante, sem recursos médicos ou estrutura sanitária razoável (atualmente se encontra na vila feita perto do hospital, para hospedar aqueles que precisam prolongar o tratamento, sem precisar voltarem para suas vilas ou cidades de origem). Mesmo se conseguirmos sucesso em cicatrizar sua ferida, sua diabetes não tem sido controlada com os medicamentos orais (que já são difíceis de se comprar no país) e ela precisa de insulina. Aí, é uma realidade muito distante da paciente. Conseguir a insulina, conservar adequadamente, se possível em geladeira, que ela não tem. Não há sequer energia elétrica onde mora. O Dr. Collins, médico angolano-canadense que se especializou em cirurgia de cataratas para viajar pelo país devolvendo a vista aos que ficaram cegos em decorrência da catarata, me disse algo que me chocou: “Dar o diagnóstico de diabetes aqui é como assinar o atestado de óbito. Não há como tratar na maioria das vezes.” Os pacientes logo morrem em decorrência das muitas complicações da diabetes. Para vocês terem uma idéia, a hemodiálise só existe na capital, mesmo assim poucas máquinas de diálise que atendem a pouquíssimos pacientes. Aí a gente pensa como expressou a Norinha: “Aqui a gente fica com saudade do SUS.” É triste, mas é verdade. Nós, que conhecemos todas as dificuldades do SUS, especialmente quando se adoece sem se contar com um bom seguro saúde, constatamos aqui que o SUS ainda ofereceria infinitamente mais do que se oferece aqui. Isso, em um país que diz estar crescendo à custa dos petrodólares a uma taxa comparável com a China. Parece que os petrodólares não aparecem para melhorar as condições de vida e saúde, pelo menos como a gente esperaria ou sonharia.
Uma observação: reparem como o hospital onde trabalhamos, apesar das limitações de recursos, é limpo e bem cuidado, o que é algo raro no contexto africano.

Um comentário:

  1. Fico até com vergonha de mim...Ontem tivemos de levar as crianças para a escola de metrô. Foi uma luta, pois a Cristiano Machado estava alagada e ninguém subia ou descia a avenida. As estações estavam lotadas. Entre deixá-los na escola e chegar no trabalho foram duas horas. Fiquei horrorizada! E pensando naquelas mulheres cheias de filhos que usam o transporte coletivo por necessidade e não por opção. Não sei como elas conseguem... Mas existe problema muito pior. E você que o diga! Sempre conheci as dificuldades do povo africano, mas vivenciá-las é bem diferente. Pensar que um ser humano morre por conta de diabetes é chocante! Mais uma vez peço a Deus que te ajude.

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