sábado, 29 de outubro de 2011

Não quero colocar nenhum título para não usar nenhum nome feio

Esse é um post triste, refletindo sobre uma criança de 8 meses que faleceu no hospital essa semana. Seu nome é Micayla Naguya, e veio ao hospital desidratada, apática, com febre, com história de diarréia há 2 meses, já tendo tido passado por várias clínicas antes de ir ao hospital, sem sucesso nos tratamentos.
Começamos tratamento para infecções intestinais, febre tifóide, malária (que mostrou-se positiva) e amebíase, mas a criança não reagiu e só foi piorando. Veio a falecer dois dias após ter chegado ao hospital, a despeito dos tratamentos instituídos.
Se você me perguntar qual o diagnóstico definitivo da pequena, vou dizer que não sei. Um dos graves problemas que temos é a falta de recursos diagnósticos, além da falta de medicações.
Um dos elementos muito tristes da história dessa menina, comum a tantas outras histórias aqui, é que a família provavelmente vai “diagnosticar” que alguém, na vizinhança ou mesmo na própria família, fez algum feitiço que matou a criança.
É uma tristeza. Não vão culpar a falta de saneamento, de medicamentos, de exames, de competência, a corrupção que atrapalha o desenvolvimento, coisas assim. Essas coisas eles não percebem. Foi o feitiço que matou a menina! Me desculpem os antropólogos que acreditam que isso é cultural e não se deve mexer nisso. Essas crenças só estimulam o atraso, e deixam as pessoas presas às práticas de feitiçaria e ao medo. Só o Senhor para mudar essa realidade. Que Ele use o Seu povo para isso.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Trabalhando com Dra Karen


Desde o início de agosto, tenho tido a alegria de trabalhar por 1 dia da semana em uma clínica distante do Lubango uns 30 km. Apesar da distância pequena, é impressionante como a realidade do local é diferente da do hospital CEML, onde trabalho nos outros dias. Ali nessa clínica atendemos mais pessoas que moram em pequenas vilas, nos seus casebres, distantes da cultura da cidade. Poucos que são atendidos ali falam o português, e sempre é preciso alguém ou da família ou funcionário da clínica para traduzir a consulta. Muitos vivem em condições muito precárias, e a malária e a tuberculose são muito freqüentes. Ali na clínica vive há uns 20 anos a Dra Karen, médica canadense, que tem dedicado sua vida ao atendimento dessas populações, esquecidas e desprezadas por muitos, mas não por Deus e por aqueles que se dispõem a servi-los, como é o caso da Dra Karen. Dá gosto estar ali, e ver o seu carinho, atenção e dedicação, lutando contra muitas resistências para combater doenças que já deveriam ter sido erradicadas da face da terra, não fosse a pobreza e baixas condições de vida de uma grande parte da população mundial. Muitas vezes ela tem que lutar contra as próprias estruturas de saúde do país, para garantir que as medicações sejam providas a essa população. Dra Karen é um doce de pessoa, mas “boa de briga”, quando é preciso.
Trabalhando ali também deixou claro como a “burrocracia” trabalha contra o povo. Dra Karen teve que ir às pressas para o Canadá, devido a uma situação de cirurgia de urgência de seu pai, com sua mãe já idosa sem condições de lidar com a situação sozinha (a gente percebe que no chamado primeiro mundo não existe a estrutura familiar e comunitária para atuar nessas ocasiões, como existe nos chamados Terceiro e Quarto Mundos). Como eu tinha que sair também, pela renovação dos vistos, a clínica ficou sem médico algum. Deixei meu telefone com os enfermeiros, que poderiam discutir comigo se algum caso mais grave chegasse ali. Enquanto estava batendo a cabeça com a burocracia da embaixada aqui, que não queria aceitar a minha carteira de identidade que havia sido emitida pelo Conselho Regional de Medicina (o que já havia sido aceito várias vezes antes!!), o enfermeiro esteve em contato comigo por causa de uma menina de seis anos, que chegou lá toda inchada; me parecia pela descrição uma descompensação cardíaca, talvez por um problema congênito ou infeccioso. Pois é, enquanto lutávamos contra a burocracia, a menininha morreu. É claro que não dá para dizer que se eu estivesse lá a menina seria salva, mas dá para dizer que esses “burrocratas”, que vivem tranquilamente no Brasil, não estão nem aí para o seu próprio povo, morrendo sem atendimento médico. DESABAFEI!!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Riqueza e pobreza


Depois de um bom tempo sem postar aqui, acho que sem inspiração, venho novamente colocar uma pequena reflexão. O Brasil é considerado uns dos campeões mundiais da desigualdade social, mas aqui a coisa parece ser pior. Talvez a situação aqui não apareça nas estatísticas pois ninguém sabe quanto dinheiro os mais ricos têm e também a pobreza não é dimencionada. Essa foto, tirada por nossa amiga Caroline Petraconi, mostra um pouco da realidade aqui: um carrão enorme, modelo Hummer, e várias mulheres com suas bacias e crianças dependuradas, a busca de vender alguma coisa para sustentar suas famílias. São duas coisas que impressinam aqui: a pobreza de tantos e o número de carros importados e de luxo. É até difícil de acreditar; choca mesmo. Infelizmente, parece que no Brasil também não nos importamos muito com o contraste entre a pobreza de muitos e a riqueza que muitas vezes é canalizada para luxo e vaidades. Infelizmente nosso coração tem a tendência de prestar mais atenção nos que têm mais do que nós e esquecer rapidamente dos menos favorecidos. Tenho que confessar que minha tendência é prestar mais atenção nos "carrões" do que nos pobres desse mundo. Devemos seguir o exemplo do Senhor, que se associou não aos que tinham muito, mas aos que eram escória. "Sempre que o fizerdes para um desses pequeninos, é a mim que o fazeis" disse o Senhor. Temos que repensar nosso conceito de pobreza e riqueza, cultivando verdadeiros "tesouros" que nunca se acabam, não podem ser roubados ou corroídos pela inflação ou por oscilações do mercado. Que o Senhor nos dê o Seu coração.

sábado, 11 de junho de 2011

Há quanto tempo você tem esse problema?


Estou escrevendo sobre esse paciente na foto, para ilustrar um problema comum que encontramos no hospital. Como podem ver, esse paciente apresenta uma massa enorme sob sua mandíbula, que empurrava a língua e já estava dificultando a fala e também a deglutição. Ele vinha de uma pequena cidade a uns 400 km de distância. Sua idade é 21 anos, e quando perguntei há quanto tempo aquilo estava crescendo, para meu espanto ele me respondeu: “desde que eu era bebê”. Demorei um pouco a acreditar, mas infelizmente essa é a realidade no país. As pessoas que vivem um pouco mais distantes dos centros urbanos muitas vezes não têm qualquer médico na região que possam consultar. Quando moram nos centros urbanos, existem médicos, mas o acesso muitas vezes é difícil e a qualidade muitas vezes deixa muito a desejar, sem contar que muitas vezes os pacientes são maltratados, além de mal tratados (deu para fazer um trocadilho?). Assim, não faz muito parte da cultura procurar pelo médico diante de algo com que se dê para conviver. Se a coisa começa a piorar ou a preocupar, a primeira opção na maioria das vezes não é procurar algum atendimento médico, mesmo que exista por perto, o que nem sempre é o caso como disse. As pessoas geralmente procuram algum tipo de curandeiro, mesmo porque acreditam que todas as doenças vêem de algum mal olhado ou feitiço que alguém colocou. Se, depois da “mandinga” a coisa não se resolve, e principalmente se há piora, passa-se a considerar procurar atendimento médico. O nosso paciente nasceu com um pequeno cisto que foi crescendo progressivamente. Como conseguia conviver com o problema, apesar do desconforto e do óbvio problema estético, ele foi levando por anos e anos, até que o volume aumentou demais e passou a atrapalhar sua fala e alimentação. Quando vi essa massa enorme, e diante da história que o paciente contou, me lembrei que na pediatria estudávamos um tipo de cisto, chamado cisto tireoglosso, que crescia na região. O que era quase inacreditável é que nunca tivesse sido abordado e tivesse chegado a esse tamanho. Graças a Deus o Dr Steve Foster tem uma boa reputação por todo o país, e esse paciente, mesmo morando longe, tinha conhecimento do nosso hospital e veio consultar conosco. Encaminhei-o ao Dr Foster, que agendou a cirurgia e corrigiu o problema. O lema do nosso hospital é “Saúde através de Jesus Cristo”. A razão de estarmos ali é para que haja atendimento médico de qualidade disponível, e que as pessoas cada vez menos recorram aos “curandeiros”, se expondo a todo tipo de complicação, tanto do ponto de vista médico quanto do ponto de vista espiritual; para que possar deixar os mitos e enganos e conhecer “o Caminho, a Verdade, e a Vida”.

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Espera recompensada / Visita a Victoria Falls - Zimbábue














Enquanto estamos esperando os vistos para voltar ao trabalho, tivemos um presente divino. Um casal de missionários nos presenteou com uma semana de hospedagem em Victoria Falls, no Zimbábue. É um dos lugares mais lindos do mundo, considerado uma das sete maravilhas naturais do mundo, junto com a nossa Baía de Guanabara, o Himalaia, Grand Canion, e outras três. Assim, viajamos de carro cerca de 1450 km e passamos uma semana ali. Na viagem, além de conhecermos um pouco de Botswana, um belo país com uma boa estrutura de turismo, pudemos ver alguns elefantes e antílopes ao lado da estrada.
Em Zimbabue, além de termos ficado em um belo condomínio, com presença constante de pequenos javalis, babuínos, e alguns viadinhos (os animais mesmo hehehe) ao redor da nossa casa, pudemos visitar as magníficas cataratas, uma das vistas mais impressionantes do mundo. Era época de cheia e o vapor que sobe das quedas, pelo volume das águas, forma nuvens de "spray" que sobem a uns 100 m acima do topo das cataratas, molhando bastante quem se aproxima.
No parque das cataratas também encontramos a famosa estátua em homenagem ao missionário médico pioneiro e desbravador do interior africano David Livingstone (1813-1873). Aos que questionam os benefícios da presença missionária na África, recomendo o excelente artigo, escrito por um jornalista britânico ateu, em inglês, discutindo sobre o efeito do Evangelho na África: http://www.timesonline.co.uk/tol/comment/columnists/matthew_parris/article5400568.ece
Na região também, além do impressionante rio Zambezi, que forma as cataratas, e no qual fizemos um passeio de barco, assistindo hipopótamos e crocodilos em seu habitat, a gente pode fazer passeios e ver todo tipo de animais selvagens, como antílopes, girafas, elefantes, entre outros. A quantidade de elefantes é tão impressionante, que vimos passar em frente ao nosso carro, num passeio ao Parque Nacional do Zambezi, uma manada de quase uns 100 elefantes, de todos os tamanhos. Eles também visitavam o poço de água em frente ao nosso hotel, e até a estrada próxima à cidade. Tiramos muitas fotos e ficamos a apenas uns 5 metros desses enormes mamíferos. Muito legal.
Foi uma viagem inesquecível, presente de Deus.
As fotos (selecionadas entre mais de 700!) mostram um pouco da nossa experiência.
Agora é continuar aguardando os vistos...
Legenda das fotos de baixo para cima: 1)Família em frente à estátua do David Livingstone 2a5)Fotos no parque das Cataratas de Victoria 6)David e Paula na ponte sobre o canion do Rio Zambezi, dividindo Zimbábue e Zâmbia 7)Meninos estudando na varanda da nossa casa em Victoria Falls 8)Javalis em frente a nossa casa 9 a 12)Girafas, crocodilo e hipopótamos que vimos na região 13)Elefantes no poço em frente ao hotel no condomínio onde estávamos

sábado, 7 de maio de 2011

Dr Collins ou Charlie Sheen?


Esse simpático senhor da foto se chama Steve Collins. Ele nasceu no interior de Angola, filho de missionários que trabalhavam na área rural, na primeira metade do século XX. Ele viveu em Angola a maior parte de sua vida, apesar de ter saído para estudar no Canadá, terra de seus pais, onde se formou em medicina. Voltou para exercer a medicina em Angola, e, nos anos da guerra ainda, sentiu a necessidade de se especializar em cirurgia para cataratas. De volta a Angola, ele viaja por todo o país dando literalmente "vista aos cegos". É uma alegria ver pessoas idosas, que às vezes estão há anos sem enxergar nada, de um dia para o outro terem sua visão restaurada. É comum ver essas pessoas cantando e dançando de alegria depois de poderem ver novamente.

Aí você pode estar se perguntando o que o Charlie Sheen tem a ver com isso. Bem, na verdade nada. Me chamou a atenção há alguns dias as notícias de que o Charlie Sheen, figura freqüente na mídia, ultimamente com notícias focalizando sua vida de vícios e promiscuidade, após ser desligado da série "One and a Half Man", teve os ingressos para sua recém-lançada turnê rapidamente esgotados, e teve o recorde de seguidores do Twitter ao abrir sua conta, atingindo um milhão de seguidores em 24 horas.

A pergunta que eu faço é por que o mundo provavelmente nunca vai ouvir falar do Dr Collins, com todo o bem que faz aqui, e a notoriedade que pessoas como Charlie Sheen, Britney Spears, Lindsay Lohan, Paris Hilton, só para citar alguns, atingem. O mundo coloca nos holofotes essas pessoas que têm muito pouco a oferecer (na verdade são dignos da nossa compaixão e não da nossa admiração ou inveja), ignorando pessoas com uma grandeza de caráter enorme, que passam suas vidas no anonimato em certo sentido.

Isso talvez nos mostre quais são realmente os valores de nossa sociedade, por mais que tentemos nos convencer que a bondade, a caridade, o amor, o auto-sacrifício, etc, são valorizados por nós como sociedade. Que mais pessoas possam começar a "seguir" os Dr Collins da vida e menos os "Charlie Sheens".

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Vencemos a viagem!



Estávamos preocupados com a viagem que faríamos: mais ou menos 1300 km, sendo 450 em Angola e o restante na Namíbia. A parte de Angola tem um trecho de 90km em que 80km estão totalmente destruídos, diferentemente do restante do trajeto. Levamos 4 horas (literalmente) para percorrer esses 80 km, e outras 4 horas para percorrer os outros 380 km em que as condições são boas. A foto da postagem mostra um pouco da situação. Se repararem, há uma estradinha ao lado da estrada principal. Na verdade, sempre há duas ou três estradas menores, abertas devido às péssimas condições da estrada principal. Isso leva a gente a perguntar por que se abrem estradas paralelas e não se conserta a estrada principal. Por que, quando o país recebe divisas devido à exportação de petróleo e diamantes principalmente, não se investe na principal via de comércio terrestre, que traz coisas da Namíbia e da África do Sul, evitando atrasos, perdas, etc? Parece que a resposta é óbvia, não muito diferente do que temos no Brasil, apenas um pouco piorado: os governantes estão mais preocupados com seus próprios "problemas" do que com os problemas do país.
A outra foto é da famosa árvore daqui, muito vistosa, o umbundeiro, símbolo da terra e também lugar ao redor do qual a comunidade se reúne. Muito bonita árvore. No nosso caminho, era fonte de inspiração e também providenciava o único local de abrigo em quilômetros e quilômetros de estrada sem posto ou lanchonete disponíveis.
Na fronteira, outra "batalha" que temíamos em parte, foi tudo relativamente tranquilo. O único problema é que apesar de estarmos no domingo de páscoa e próximo ao horário de fechamento da fronteira, não tínhamos o tumulto de sempre mas havia literalmente dezenas de jovens tentando "ajudar". Só que essa "ajuda" não era muito bem vinda. Eles nos cercam, querendo nos direcionar no que fazer, mas em troca de dólares e numa disputa acirrada entre eles. Uma situação muito desconfortável. Para piorar a situação, não há qualquer sinalização ou direcionamento por parte dos funcionários da fronteira, e um guarda quis me "multar" dizendo que parei o carro no lugar errado, apesar de haver dezenas de outros carros lá e não haver qualquer indicação de onde se deve parar. Argumentei com ele o absurdo da tal multa, que obviamente era só uma tentativa de extorquir, dada a inconsistência da mesma. Ele acabou amolecendo, apesar de que o rapaz que acabou nos "ajudando" disse que o guarda estava esperando seu "pagamento". Pregamos para o rapaz, que estava quase alcoolizado, e falamos da esperança em Cristo para uma nova vida. Ele acabou concordando que não deveríamos dar a grana que o guarda pediu e passamos sem maiores problemas, graças a Deus.
No lado da Namíbia ainda eram cerca de 800km a vencer, mas pernoitamos perto da fronteira e no outro dia fizemos a viagem sem maiores problemas. Nos chamou atenção que enfrentamos umas 6 ou 7 barreiras policiais, mas, ao invés de estarem atrás de propinas, estavam mesmo buscando irregularidades, especialmente motoristas que estavam excedendo no feriado prolongado, seja na bebida ou na velocidade.
Com um coração agradecido e aliviado chegamos no fim do segundo dia a Windhoek, capital na Namíbia, onde vamos aguardar nosssos vistos para voltarmos ao trabalho.
Orem conosco para que nosso tempo aqui seja breve e abençoado.